Um dia antes do trekking, dormimos num hotel na pacata e bela cidade de Caraz próxima às montanhas, quase no final do Callejon de Huaylas.
Aproveitamos para provar o delicioso ”helado” e o ”dulce de leche”. Um doce tradicional muito parecido com o nosso mumu. Caraz tem o apelido de “Dulzura” por conta de seus ótimos doces.

O Trekking Cedros Alpamayo é um roteiro pouco conhecido nesta região e localiza-se aproximadamente ao extremo da Cordilheira Branca. Geralmente o percurso dura em torno de 6 à 10 dias. Resolvemos fazê-lo em 6 dias, totalmente auto-suficientes, finalizando o trekking do outro lado da cordilheira, na pequena cidade de Pomabamba, o que foge um pouco do roteiro tradicional, pois é a forma que mais gostamos de conhecer novos lugares, tendo todo o tempo disponível e tendo liberdade para ir adaptando o roteiro dia a dia. Todo o trajeto levou 6 dias, (os detalhes dessa aventura você confere abaixo ) onde percorremos aproximadamente 67km. Nos impressionamos com as fortes subidas, tivemos um total de 4.600m de ascenso. O passo mais alto foi o Culicocha com 4.900 metros acima do nível do mar.
O grande atrativo deste trekking é o nevado Alpamayo, pois neste caminho avistamos a sua face norte que é famosa por já ter sido considerada a mais bela montanha do mundo em um antigo concurso da Alemanha.

Vimos esta face pessoalmente e podemos afirmar que é linda demais, uma piramide perfeita que se destaca das outras montanhas por sua forma.
Confira algumas imagens desta aventura:
Dia 1 – 07 de agosto de 2019 / Acampamento improvisado
No dia seguinte pegamos um táxi às 8h da manhã e fomos até Hualcayan. A corrida com o carro durou aproximadamente 2 horas. Esse lugar é uma pequena vila de campesinos onde cultivam amendoim. O taxista nos deixou bem próximo do início da trilha. Assim que começamos a caminhar com mochilão nas costas, aparecem 3 meninas que aparentavam ter uns 12 anos, bem atrevidas. Nos abordaram e nos disseram que para passar por ali, tínhamos que pagar 20 soles cada um. Antes mesmo de perguntarmos, já nos explicaram o porque: Que ali não tinha haver com o Parque Nacional e que estavam recebendo ordens do governo para poder reformar uma ponte na rota. Então me virei ao taxi e perguntei se realmente aquilo era verdade. Ele pediu a menina que mostrasse uma nota onde constava uma assinatura importante que confirmava a cobrança. Então ok, sem problemas. Atravessamos um riacho e logo (pra variar) começou a subida.
Durante o caminho víamos os campos de trigo e as conhecidas ”punas” (pastos secos).
Foram 900m de aclive sofridos, por caminho hora demarcado, hora não em zig zagues até às 16h, que foi o momento em que não aguentávamos mais subir. Encontramos um local para acampar atrás de uma imensa rocha, porém tivemos que limpar, pois havia estrume de gado. Tínhamos uma vista bonita para um imenso vale e a Cordilheira Negra.

Mais além podíamos avistar luzes de uma cidade no alto chamada Huaylas. Há uns 300m de distância havia uma cascata, do qual pegamos água para filtrar e cozinhar os nossos alimentos. Nessa noite fizemos uma deliciosa sopa de legumes e descobrimos que esquecemos o sal. Depois aquele mate para relaxar e dormir bem para o dia seguinte que prometia ser mais intenso.

Dia 2 – 8 de agosto de 2019/ Acampamento Ruina Pampa
Conhecendo a Laguna Cullicocha
Depois de um café reforçado e levantar acampamento, começamos a caminhada às 8h. Ainda fazia frio até sairmos da sombra, o sol estava refletindo só mais em cima. De princípio, mais uma subida em ziguezague que parecia não ter fim, até chegarmos na laguna Cullicocha à 4620m com suas águas de degelo com uma cor incrivelmente azul sob os nevados Santa Cruz e Milhuacocha.
Lá existe um posto de controle desativado, com estação meteorológica. Depois descobrimos que esse lugar era uma hidrelétrica, porém parou de funcionar porque estava acabando com a água das comunidades campesinas próximas e por questão do impacto, aquecimento global e derretimento de gelo acelerado. Aproveitamos a instrutura da varanda para fazer um lanche reforçado e descansar na sombra por cerca de uns 40 minutos. Enquanto estávamos no sol, várias moscas nos rodeavam e aquilo estava ficando irritante. A porta da instrutura estava aberta e coincidentemente encontramos um sal! Que beleza!
Depois de uma lagarteada e fotos continuamos a tocar pra cima, até chegar no passo Osoruri à 4800m na Quebrada Santa Cruz/Alpamayo. Não foi nada fácil chegar até aí, com sol forte e moscas, a umidade baixa e altitude faziam a pernada render menos ainda.

Depois de uma baixada de 300m, mais uma subida, o Passo Vientunan à uma altitude máxima de 4770m. Depois descemos 1200m sem parar, pois o pôs do sol já estava por acontecer. Nesse caminho encontramos somente 1 mochileiro raiz italiano, com roupas bem roots, carregando 1 mochila nas costas e outra na cabeça (WHATT? :o) conversamos um pouco e já apertamos o passo.

Essa descida parecia não ter fim, o Renan como é maior e tem as pernas compridas tem mais facilidade de descer. Eu sempre acabo ficando pra trás pois sou pequena com pernas curtas. Depois de alguns tombos cheguei ao acampamento Ruina Pampa, já no vale da quebrada próximo ao rio às 18h.

Renan já estava montando acampamento enquanto eu tirei a mochila e fiquei deitada numa pedra tentando pensar em tudo que eu caminhei nesse dia, sem dúvidas um dos dias mais intensos no Peru. A noite foi chegando e com ela o vento e a baixa temperatura. Fizemos o nosso jantar, dessa vez um macarrão com legumes no lado de fora e antes das 20h entramos na barraca porque estávamos acabados. Por ser um trekking menos conhecido, se torna até mais especial e menos intocado, somente os mais experientes e corajosos se atrevem a essa jornada. Acabamos nem tirando foto a noite no acampamento.
Dia 3 – Dia 9 de agosto de 2019 /Sedros Alpamayo / Acampamento Jancarurich
Primeira vista do Nevado Alpamayo

Dia de caminhada leve, apenas 6 km com aclive suave pelo vale por 3 horas até o acampamento. Tomamos o café tranquilos e começamos a caminhada às 9:30h. Na metade do caminho avistamos a face norte, a mais bonita do nevado Alpamayo (5947m). Como chegamos cedo ao acampamento fizemos um almoço e aproveitamos para lavar umas roupas e curtir a paisagem, relaxando um pouco na barraca.

A tarde fizemos um ataque a Laguna Jancarurich, de cor impressionante, aos pés do nevado Alpamayo.

No acampamento havia umas 3 pessoas com uma agência e só nós, solos. Nos divertimos ao ver a curiosidade do gado se aproximando da nossa barraca. Depois lagarteamos, observando os pássaros, os nevados, todo ecossistema em volta e tirando belas fotos.

Dia 4 – 10 de agosto de 2019 / Acampamento Huilca
Fortes subidas ao Passo Garara e Passo Mesapata
Acordamos bem cedo, pois esse dia também prometia ser intenso com muitas subidas. Que incrível ver o amanhecer dessa face do Alpamayo!

A pernada do dia foi de 14 km teve 2 passos de montanha e o primeiro passo foi o Garagara à 4860m. Vista impressionante para os nevados, com destaque para o Apamayo 5950m, Tayampampa 5657m, Jancarurich 5578m e Quitaraju 6036m. O percurso tem uma boa inclinação e ventos constantes. A subida foi intensa, porém como estávamos acostumados, subimos num ritmo tranquilo e não sentimos tanto o cansaço.

Quanto mais subíamos mais bonita se tornava a laguna Jancarurich e o nevado Alpamayo. o sol refletindo nela mudou sua cor para um verde esmeralda. Olhando 360° praticamente todos os lados víamos os nevados lá em cima a mais de 5000m.

Depois de muitas subidas e vistas alucinantes, quase chegando no passo ainda podíamos pisar nas poças de gelo e observar algumas lagunas congeladas.

Depois da descida, caminhamos por um trecho planos de 6 km e mais um passo chamado Mesapata à 4474m. Essa subida foi mais tranquila, caminhamos mais um trecho pelo plano. Chegamos ao acampamento Ilca (4000m) às 15:30h. O lugar contava com criação de alpacas, cavalos e paisagem diferente. Próximo também havia uma casa de campesinos e uma estrada de chão. Encontramos o melhor lugar, perto de um riacho com um belo fluxo de água e montamos acampamento.

De longe avistamos uns nativos chegando de moto e percebemos que os vestígios de civilização começam a aparecer.
Ficamos impressionados com as formações rochosas desse lugar!

Dia 5 – 11 de agosto de 2019 / Acampamento Jancacucho / Pomabamba
A última pernada
Acordamos cedo e seguimos em direção ao passo Ianacon. Passamos pela única casa que havia próximo do Camping e havia uma família grande morando aí. Perguntamos se havia cerveja e nos disseram que não, só no próximo acampamento. E logo umas crianças gritaram ”chocolates, chocolates”. É muito comum no Peru ver crianças pedinchando comida na trilha porque sabem que a maioria dos mochileiros oferecem. Infelizmente não tínhamos mais, nossa comida estava acabando e precisávamos acelerar o passo para chegar no camping Jancacucho onde teria suprimentos para comprarmos.

Um pouco antes de começar o passo…

No caminho encontramos porcos cavando o chão loucamente procurando alimento, eles estavam tão concentrados que nem notaram a nossa presença.

O Renan nesse dia estava um pouco mais lento que o normal, parando muitas vezes. Cheguei no passo por primeiro e gritei pra ele ” VAMOS VAMOS, VOCÊ CONSEGUE!”. Até cai um tombo porque havia muito vento, tive que me esconder por detrás de algumas pedras. Minha aclimatação estava ótima. Saímos de 4000m e fomos a 4600m de uma vez só, uma baita subida, com paisagem ”hermosa” para os nevados.
Fiquei escondida esperando o Renan por detrás das pedras, não aguentava mais o vento incessante.

Na descida avistamos o outro lado da cordilheira, com a laguna Sactaycocha e uma incrível cascata que ainda estava congelada em suas extremidades. Parece que você entra em outro mundo, com mais vegetação, árvores quenoales e flores pelo chão. Caminhamos pelos pampas floridos por mais um longo trecho até chegarmos a mais uma descida com 1.200m. A partir desse ponto a vegetação se intensificou mais ainda. Logo chegamos novamente em pasto aberto no acampamento Jancacucho à 3500m.

Ao longe via-se casinhas de campesinos e uma van que passava lá por perto. Não nos demoramos muito e fomos em direção a esse “pueblo” Jancapampa. Lá paramos na casa de uma campesina e pedimos se não havia cerveja. Prontamente ela disse que sim e nos ofereceu um lugar pra sentar na varanda da sua casa. O lugar é bem simples e precário, porém ela foi um amor de pessoa que nos deu atenção e conversou com a gente. Nos disse que era nativa desse lugar. E que os nevados como Taulliraju (5930m) que avistávamos ao longe, à poucos anos atrás era bem mais imenso, o glaciar chegava até quase nos campos. Eles mesmos que faziam suas próprias roupas, como suas calças e saias com a lã de ovelha. Tinha uma maquina manual de tesselar atrás de nossos bancos. Ali nesse ”pueblo” haviam 4 famílias e todos tinham rebanho de ovelhas, cavalos e galos. Eles possuíam cabanas de palha para armazenar as trutas. Tomamos nossa cerveja, agradecemos sua atenção e continuamos mais uma meia hora ate onde pegaríamos a van. Não tínhamos certeza se passaria naquele dia, já era 16h. Mas a grande alegria foi que quando chegamos, a van também chegou então não precisamos acampar por ali, fomos direto a cidade de Pomabamba.

La nos hospedamos num hostel, tomamos um merecido banho, depois de 5 dias. E fomos numa polleria comer o tipico ”pollo com papas” frango com batatas fritas. Tivemos uma noite ótima, bem dormida.
Dia 6 de agosto de 2019 – Banhos termais -Retornando para Huaraz – 7h de ônibus
No outro dia pela manhã, fomos aos banhos thermales. Descobrimos que lá não havia piscinas e sim vários banheiros com chuveiros de água thermal. Aproveitamos mesmo assim, já que custava apenas 1,50 soles por pessoa. Ficamos um pouco no jardim curtindo e logo retornamos para o hostel terminar de arrumar a mochila. Às 11 h saiu nosso ônibus novamente para Huaraz. Nosso percurso foi de 7h, e praticamente 70% do trajeto foram totalmente desconfortáveis devido a quantidade de pessoas que haviam no ônibus, as estradas esburacadas com subidas e descidas ingrimes, precipícios e curvas insanas. No meio do caminho caiu a descarga do transporte, tivemos que esperar na estrada empoeirada por uma meia hora. Pegamos um trecho de asfalto e quando finalmente chegamos em Huaraz um alivio para as nádegas. Com a mochila nas costas , fomos direto comer uma pizza no restaurante ”Abuelo”. Nossas mochilas ficaram super empoeiradas. Uma aventura que jamais iremos esquecer, do início ao fim!
Saímos de Sedros Alpamayo, com aquele sentimento de sonho realizado, com toda certeza foi o trekking mais intenso, difícil (por causa da altitude) e impressionante que fizemos até hoje. Quanto mais inóspito mais a gente gosta, se desafia, se supera. Uma das lições que tiramos de cada trekking é que conseguimos muito mais do que imaginamos, um passo de cada vez e chegamos aonde quisermos.
E a nossa aventura no Peru não para por aí….em breve novidades depois desse trekking punk, já estávamos preparados para a próxima ALTA MONTANHA…e dessa vez solos!!!
Fiquem ligados!
FIM
One thought to “Trekking Cedros Alpamayo”
Demais! E é isso, quanto mais inóspito, mais ” difícil”, mais motiva e nos mostra o quanto somos capazes…pretendo ir agora em maio, valeu pelo relato!